quarta-feira, 30 de junho de 2010

A Partida


"e ela se foi como quem jamais houvesse chegado. deixou apenas o seu perfume impregnado nos lençóis, nas minhas camisas.
e ela se foi sem olhar para trás sem qualquer renúncia, sem qualquer apego. deixou apenas sua palavra impregnada nas paredes, na minha cama.
e ela se foi levando presenças e lembranças, com os olhos cheio de espera, cehios de medo. e ela se foi porque havia chegado a hora. deixou qualquer recado ao telefone, qualquer carta escondida dentro de um livro, qualquer desejo de permanência.
ela se foi como a brisa a balançar a cortina da janela, a espalhar papéis , a balançar os cabelos. levou mistérios e olhares, beijos e amassos, afagos e gemidos. mas ela, ao meio dia de uma tarde de primavera, se foi.
talvez não fosse a certeza de sua ausência, seria mais fácil enganar o nó que vai se formando, quando ao meu lado na cama, ela tão menina e tão donzela, não houvesse deixado tão sutilmente.
e ela se foi como se tivesse se desmanchado, tal pétalas de uma margarida, desfolhada. deixou no cinzeiro resquícios de sua presença, deixou os sapatos, tão altos que me incomodavam, deixou sua caneta, aquela que mais gostava. foi embora com aquele olhar tão longe, tão perdido, a confundir-se com paisagens áridas e desérticas.
(...)
queria ter colhido ainda mais flores no dia de tua partida. queria ter falado qualquer verdade que a fizesse lutar, queria ter tido um pouco mais de coragem. queria que por causa dos meus olhos, verde-tão-azul, que ela se perdia e se apaixonava, queira que isso a fizesse ter ficado.
mas ela se foi. deixara em mim poesia e silêncio. imenso amor. imenso rio-mar.
e ela se foi tão bonita, tão serena, tão inteira a não partilhar nenhum pedaço de sua fuga. falava em seu ouvido que morrer era apenas fechar os olhos, mas ela, tão incrível e demente, tão doce e fervente, se foi sem ao menos dizer adeus.
(...)
queria ter inventado medidas, queria ser teu espelho de sonhos tão destruídos, queria mas queria tanto que sua alma não fosse tão livre. e mesmo assim, vestida com todas aquelas vaidades de sempre, ela se foi. tão perdida e tão repleta a me deixar de mãos tão vazias e olhos tão vagos de esperança.
ela se foi."

Súplica


"Salva, qualquer súplica, qualquer palavra desmedida. Salva, qualquer que seja a redenção. porque não quero morrer em pecado. porque não quero morrer de amor. Pois de amor é preciso que se viva!


entra e arruma tua cama, tua mala. escreve em mim bilhete de saudade. deixa em mim, qualquer gosto ou mau gosto. porque em ti sei que é meu aroma que te acompanha. remeta qualquer carta, cartão postal, ou deixa que o silêncio maldito das horas nos afaste para um sempre que jamais esqueceremos.


Devolve, de qualquer maneira o escarneo úmido que nos fez tanto em noites de gozo profundo e poucas verdades, poucas certezas.porque de paixão eis a redenção e o renascimento.porque de paixão eis a vida e a morte, seja em qual for circunstâncias.


entra e arruma em mim qualquer motivo para o beijo, qualquer desculpa para o abraço, qualquer consolo para o choro. porque em ti, terei abrigo, porque em mim de joelhos reza qualquer ladainha, porque em mim tens seio da vida.


Salva, qualquer mentira ou verdade, qualquer desejo ou farsa, para que bêbados possamos comemorar a evidência de nossa ingenuidade. para que felizes possamos morrer sob um céu estrelado ou não. para que de amor sejamos convencidos e vivificados.


Devolve seja como for aquele olhar que me aquece, que me motiva, que me protege o seu lugar devido dentro de mim, devolve todas as palavras e ensina-me como amar-te com silêncio e verdade. porque de ausência estou farta.


entra e arruma em nosso canto qualquer recanto de fuga, qualquer pedaço de ternura, qualquer fatia de amargura e juntos comamos o pão de todo dia, ainda que de vinho e água sejamos feitos em diferença. porque em nós há enorme vontade, enorme fome, enorme façanha, enorme febre. porque em ti, eis fato tão consumado em mim, porque em mim eis acidente tão conformado."



Entre nós


"Retifico-me sobre tua escolha. Minha palavra basta para inventar-te em mim. Sugo de ti suor e dor.Sou tua dor. é de mim que torto anda a carregar o peso. Acendo tantas chamas e estou no escuro. Seu tudo em nada me adianta. em nada. Sou onipresente nas facetas do teu dia, na tua cólera. no teu silêncio. na tua fome. Restauro ou inauguro em ti qualquer amor que de longe me aflinge. Amo-te com a cegueira do amor que devora livros, cartas, camisas, gravatas e chapéus. Coloro-te de vermelho. porque de sangue foi banhada nossa noite. porque de paixão nos lambuzamos a encher os dedos de fúria. conheço o trajeto trôpego da tua língua e esqueço ou ignoro o cinzeiro cheio de cigarros que antes era pretexto de conversas casuais, a esconder demônios dos nossos desejos.

Experimento o silêncio que me ofereces. Nenhuma palavra basta. Ou todas me bastariam se proferidas com o ódio e a loucura que nos faz tecer juntos colcha tão macia de nossos amores. Seremos assim, tão desmedidamente apaixonados, ainda que a sensatez nos afaste, ainda que nossas declarações endureçam nossos corações já gelatinosos de amor. Estaremos sempre envolvios por qualquer encanto, por qualquer ternura ou nudez. porque nosso elo, nossa forma nebulosa de nos conceber, já não cabe unidade. Somos dualidade. Somos gêmeos em amor e ódio. Habitamos o mesmo mistério e somos feitos da mesma carne. Não temos a salvação que a lucidez empresta aos realistas. Somos almas apaixonadas. Envenenadas por qualquer desculpa do outro. Sorvemos do outro. Jamais haverá em nós redenção.

Suplico-te que me ame sem que esse amor me mate. Suplico-te que tua palavra proferida jamais me enlouqueça. Porque em mim existe guerra e em ti, antes, havia paz!"

sexta-feira, 25 de junho de 2010

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Do chamado

Amor;
Eu preciso que você venha neste exato momento. Que esqueça os momentos anteriores. que venha com a calma e o sorriso de sempre, porque,meu amor, estou morrendo.
Eu preciso que venha agora. que deixe sua casa, sua vida. seus papéis, seus temperos e sua fome, e venha tentar morder minha boca com seu veneno impreciso.
Eu preciso que você venha neste exato instante. que traga pequenas doses de alegria, para que com os remédios eu engula a paixão e a saudade que sinto.
Eu preciso que você esqueça as notícias do jornal, a realidade batendo a porta, os pincéis e as tintas, porque de amor pretendo morrer esssa noite.
Eu preciso que você venha para que eu possa respirar um pouco mais aliviada. um pouco mais mansa, porque só você é capaz de amansar as minhas bestas tão agrestes.
Eu preciso que você venha e me ame como nunca antes. preciso do seu amor maduro, feito manga, para que depois de me lambuzar eu levante da cama e possa andar perturbada pela rua. naquele calor reconfortante do desejo que me causa.
EU preciso que você venha neste instante. que abandone o antes, para que agora eu possa viver em ti. pois estou morrendo. estou farta do presente que nos afasta. estou cansada da saudade e da dor da sua espera. eu preciso que você chegue. que abra as portas, as janelas, que esqueça sua mala no sofá da sala. que perca as chaves e as passagens de volta. que esqueça o horário do trem. que se demore no exercício de me salvar, porque estou morta e preciso de vida.
Eu preciso que você venha e traga apenas seus olhos, secreto azul a cobrir-me de vida. preciso das suas mãos decididas e de tes beijos afoitos. que me envolva em desejos esquecidos que você sabe onde encontrá-los. que me despenteie os cabelos e arranque meu vestido de renda. que borre meu batom e me deixe assim por horas, sentindo-me amada, para que de amor eu possa viver, antes que seja tarde.
eu preciso que você venha neste instante e esqueça todo o antes.
Ps: eu te amo!

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Pós-chuva


"era como enxugar as lágrimas depois de uma briga."
O meu pós-chuva resume-se a isso, um enxugar das coisas que vazam. ultrapassam a barreira dos olhos. exasperam a capacidade dos poros. me obrigam ao dilatar sem que haja espaço suficiente para desaguar.
Limito as condençar das coisas e exito por vezes medir qualquer esforço de controle, na chuva é assim, um eterno e sistemático desaguar. tento limpar as lentes dos óculos, os vidros do carro, das viraças da sala de visitas, mas neste pós-chuva, além da brisa fria que vem lembrar os ossos de suas validades vencidas, o que me vem são essas gotas, quentes, a torturar minhas páginas mais brancas, tão virgens quanto o sentimento.
Tento não me liquefazer como ela, tento me manter sólida, para ser devorada pela fome silenciosa dos amores, mas em muitos momentos sinto-me escorregar garganta abaixo de quem me deseja só não assume.
Revogo as promessas, os sonhos, as incertezas, percebo que depois da chuva, pareço amolecer não só de amor e saudade, mas de demência. minha doença deve ser contagiosa, compartilho esperanças alheias. reconheço os pés afoitos que engolem a escada. talvez seja o momento de reflexão. não entendo. acredito nas coisas fugidias. amanhã fará sol e eu nem sem se já haverá passado para escrever.

Do ato


um frio arrepiando, palavras quentes a derreter na língua um caramelo. a brisa, embriagada ao som de qualquer jazz volta-nos ao primeiro estágio de encantamento. mãos afoitas caminham procurando porto, segredo, desejo. olhos cheios de uma lágrima ausente nos embarga a soluços de um amor atrasado.

(...) fazia tempo que não nos amávamos.

viscos, salivas e surpresas tonteiam as sensações banhadas de um vinho esquecido na garrafa no chão. a cama, quente, definitivo esconderijo de quem ama, acolhendo qualquer gemido agudo ou mudo. abafado por qualquer jura que certamente será esquecida.

(...) fazia tempo que não nos entregávamos.

papéis pelo chão, cortinas cerradas, beijos robados entre dentes e pedidos, abraços que se perdem na intenção de acolhimento, somos devorados. esquecemos o tamanho da nossa certeza, desejamos navegar por mares desconhecidos em nós. precisamos nos afogar. para que de qualquer paixão morramos sobre a tarde e a noite que começa lá fora tão branda.

(...) fazia tempo que não nos esquecíamos assim.

os corpos em volúpia tremem a escuridão das sombras do quarto, não haverá mais palavras, não haverá mais desculpas, silêncio e som numa mistura a calar nossas verdades absolutas. teu corpo morada da minha vitalidade, meu corpo, seu esquecimento, abertos, inteiros, mordidos.

(...)fazia tempo que não nos desejávamos tanto!

qualquer melodia infeliz. qualquer cheiro que passasse despercebido. alguns sorrisos notados, algumas lágrimas amassadas, muitas sensações emboladas a nossos pés. em nossas pernas que já não andam, que roçam, esfregam-se seios e ombros, para que de prazer possamos banhar o instante.

algumas mentiras esquecidas na gaveta do criado mudo, a vela queimando a sálvia deixada sobre o tapete. as pétalas coladas ao suor do exercício anterior. e o amor, tão manso a comer nossos nomes, nossas peles, nossas vidas.

(...)fazia tempo que não me despia tanto!

Das promessas de amor


"andarei tarde em tuas curvas. viajarei por tua pele, por teus cantos, num exercício de amor sem medidas.
andarei por nossas lembranças, em nossas fotografias, para que me recorde e nossas mágoas e sabores por tão longos anos.
irei ao teu encontro desnuda, com olhos de esperança e saudade. estarei no mesmo lugar a tua espera. tomando aquele café açúcarado e mexendo nos cabelos para demonstrar a ansiedade da tua chegada.
escutarei suas palavras, me entregarei aos teus carinhos numa tentativa de calor, para que de febre sejamos envolvidos mais tarde numa cama de lençóis coloridos como seus olhos.
acreditarei em suas juras, em tuas promessas, assim de ilusões teceremos nossa vida. para que um dia, lembrando o início possamos ser feliz sabendo que tudo fora cumprido.
dormirei em teus ombros largos, deixarei que ande em meus abismos. pedirei um beijo durante a madrugada e sei que velará meu sono na tentativa de me proteger seja do que for.
amarei com o amor mais puro, mais humano, estarei em ti como em mim estará fixado, como num quadro definitivo. para que na saudade jamais esqueçamos de como estamos unidos.
andarei por ruas a procurar-te quando longe estiver, encontrarei saídas, fugas, para que nosso desejo seja realizado, mesmo quando impossível, porque quero morrer em teus braços.
andarei pelas calçadas a procura de sol. e suas mãos estarão cruzadas nas minhas, num exercício de companheirismo. de afeto. de união. que buscamos em muitos momentos quando ainda sozinhos; e que agora encontramos.
estarei a seu inteiro dispor, porque já não sou só minha, sou tua, numa mistura que não sei decifrar, apenas sinto"

Do ontem

"De ontem em diante deixei de mascar aquele chiclete rosa que vivia escondendo na bolsa. Deixei de tirar os sapaos na entrada e de deitar no chão espalhando meus papéis escritos pela sala. Deixei também de ligar a tv para me servir de companhia. era evidente a certeza da minha solidão acompanhada.
De ontem em diante deixei de pensar em coisas que só impressiona os filósofos, resolvi viver antes que fosse tarde. Deixei de ligar e deixar recados. Não me atrelo ao desespero do tocar do telefone. Resolvi ligar mais para mim, ouvir mais minhas canções. Pensei melhor e percebi que era mais fácil dançar sozinha.
De ontem em diante deixei que minha pele falasse. Transpirasse qualquer desejo. Cansei de viver os prazeres sozinha. quero a divisão exata que mereço. Deixei de pinar os lábios de um vermelho vivo para que de um carmim naural ele se colora na hora do beijo.Deixei de vestir o luto para enfeitar a manhã com cores infinitas do arco-íris.
De ontem em diante começei a escrever menos. Falar mais o que penso, o que sinto. Deixei de sofrer por tudo que acreditava. Sorrir ainda é o melhor remédio para as dores. Deixei alguns bordados para trás. Resolvi pintar, lambuzar com as cores da minha alma. é mais pertinente o envolvimento. Deixei de ser tão resumida, quero a sensação confusa dos discursos longos.
De ontem em diante deixei de perder. Resolvi por acidente ganhar um pouco, mesmo que ganhos improváveis. Resolvi investir no risco. No sonho. Deixei de amar com a cabeça. arrisco-me num salto para dentro do peito. Amar sem qualquer garantia, de ontem em diante, resolvi que não queria mais nenhuma certeza. queria apenas o risco, o acidente truculento da vida. pura. em seu estágio bruto.
De ontem em diante esqueci no armário todas as velhas camisas que me faziam mais séria, mais educada. quero apenas o devaneio. a confusão das sensações a engalfinharem meu estômago. Deixei de apreciar as temperaturas amenas, meu coração tem febre. Deixei também as pessoas e os lugares que de qualquer modo nunca me fizeram bem. deixei-lhes um bilhete, uma desculpa. Precisava de libertar das idéias mornas. atirei-me num fogo dionisíaco. queima minha alma desde ontem, então.
De ontem em diante, passado e presente serão diferentes, escreverei outra história de amor, outro romance, terei outro cais, outro porto por onde escoarei minhas mágoas. Deixei os livros, as fotografias, os desenhos que rabisquei em cadernos velhos de sentimentos e pecados. Abanonei a solidão mofada nas minhas mãos. Arranquei os sapatos, tirei os anéis. Resolvi andar sem qualquer estrada, caminho, destino. Acho que descobri desertos em mim, de flores imensamente coloridas. de sol tão quente e inverno tão rigoroso. Era preciso que eu tomasse essa decisão. Abandonar tudo aquilo que eu pensava ser vida, e na verdade era um estado vegetativo.
De ontem em diante, nasci para um novo mundo. sem qualquer amargura, sem qualquer mágoa ou saudade. Deixei o passado para que o tempo colhesse seus frutos. O futuro visto no ontem me impressiona. Serei feliz. Uma felicidade quase clandestina. porque somos todos clandestinos quando decidimos por opção viver como se não houvesse mais nada, apenas este instante vivo. Amanhã talvez seja tarde demais. e não quero ser vítima dessa condenação.
De ontem em diante resolvi que viveria a medida que morresse. para que na morte de qualquer forma eu viva."

terça-feira, 15 de junho de 2010

Das tentativas

" Eu tenho tentado ser menos boba. Menos menina. tenho tentado caminhar com a sensação de que haverá outras chances. Tenho tentado parecer menos doída. menos pequena, embora muitas vezes seja difícil.
Eu tenho tentado acordar de manhã com menos medo. com mais certezas. com qualquer brilho no olhar para que de tristeza não morra. tenho tentado ser menos dura. olhar para as flores dos canteiros. tenho tentado não parecer tão sem rumo. meus pés tentam alcançar passos alheios....
Eu tenho feito mais sonhos, tomado menos café. Tenho tentado compreender mais as pessoas, embora quase nunca ser entendida. Tenho tentado ser franca, olhar de frente para os fatos, não me deixar enganar por eles. As vezes dói ter que encarar de peito aberto, mas isso se faz cada vez mais necessário.
Eu tenho tentado me abrir como uma rosa, deixar que minhas pétalas falem por mim, estou tentando tirar o ferrugem das palavras mais doces. Para que de afeto o outro me receba. Tenho tentado aceitar mais as razões que desconheço. aprendendo a rever limites, conceitos. Aprenendo a costurar na colcha de retalhos panos mais coloridos. Tenho tentado rir mais. Dizem ser contagiosa a alegria. preciso de um banho de felicidade e flores do campo.
Eu tenho tentado acreditar mais em qualquer coisa que me tire do chão e me faça maior que qualquer tempestade, choro, mágoa que ainda vem pela frente.
Tenho tentado e permaneço em estado de espera.

No som "Paciência" e um incenso de Margaridas para aquietar o coração.

Do amor que desejo



"Eu queria te amar assim. Repleta de reflexos da tarde. Queria me embrenhar nos teus braços e esquecer quanto tempo falta para a hora da sua partida.
Queria ficar assim, estática, num abraço demorado, numa emoção congelante, a tirar de mim o ar dos pulmões tão vivos na tua espera.
Eu queria te amar assim. Dando saltos ao teu encontro. Ouvindo qualquer bossa no ouvido. Sorrindo qualquer lembrança sua.
Queria estar assim, em permanente estado de entrega. Dar-te todas as dobras da minha vida em cartas feitas em madrugadas de frio e insônia.
Eu queria te amar assim, desmedidamente. Como criança sem qualquer limite, desvenando a palavra liberdade e escrever em meus olhos, qualquer jura que de vez te convencesse do amor desastrado que sinto.
Queria que me amasse exatamente assim, com carinho e respeito. Com afagos e segredos. Com pedidos de casamento todos os dias. Com gemidos e cumpliciades de tempos antes.
Eu queria te amar com a mesma certeza de que existem estrelas. Com a mesma fúria dos vulcões e das tempestades. Queria na calmaria de um beijo sufocar qualquer saudade que ficou para trás.
Queria segurar suas mãos, andar pela rua, abraçar na praça, esquentar suas palavras para mais tarde torná-las sensações desesperadas. Porque de amor sei que estamos sendo curados. porque de dores se refaz nosso afeto.
Eu queria te amar assim. E te amar e te amar e te amar...

Porque neste instante de manhã tão fria, amar você é qualquer coisa de quente que me esquenta agora!"

No som "Sonhos" e um incenso de Laranja para enfeitar. Na boca o amargo da nicotina para temperar nossos beijos.

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Do sujeito


"...Sujeito. Finito. Verbo de ação. Variações entre o abismo e o salto. Proporções alteradas. Visões absolutamente subjugadas.
canções e silêncios. passos pouco acelerados. razões e sentimentos embaraçados. Sujeito. aquele que transita entre a formação do possível. aquele que acredita que no eterno, no infinito. mas o que de fato existe? (certeza e um fim).
...
No som, borbulha qualquer barulho a deixar que ela não pense mais nada. Não é necessário pensar. é preciso que se viva com qualquer urgência. é necessário gastar os sapatos. é necessário. Ela precisava encontrar qualquer sonoridade a compactuar com sua emoção exorbitante dentro do peito. era necessário que de música fosse consumida. para que de longe quem observasse ficasse convencido de que existia de fato qualquer finitude nela.
A paz que exalava dos movimentos era quase como um abraço no ar, isso também era necessário, para de que companhia não morresse só. enganava as borboletas no estômago com qualquer chicletes rosa que mascava desesperada. aumentava a sensação de medo. mas a paz que exalava de seu gesto emudecia qualquer saudade ou guerra.
Teimava em acreditar no eterno, apesar de tantas vezes efêmera. Alguma verdade precisava ser absoluta. mesmo que custasse caro. talvez comprasse uma mentira e dela fizesse verdade para que de ânsia não morresse sem qualquer certeza.
A música ainda sim jorrava em seus ouvidos qualquer uivo. prescrevia ilusões, ideais, que ela não acreditava, mas fingia. não conhecia o profundo, mas apostava a fundo em qualquer tiro no escuro.
Queria porque queria a palavra sempre como companhia. mas não tinha. 'sujeito. finito'. fiava-se apenas na pequena delicadeza de cantar qualquer vontade. e ainda sim pensava, "hei de me enganar, sendo eterna, ainda que esquecida".
... ainda sim, sujeito. finito!
e era tudo que podia pensar. conflitos musicais numa tarde de inverno flutuante."

De nenhuma certeza

"A voz apaixonada dirigia a janela uma canção sem qualquer conforto. Era tarde a hora da espera. Era tarde para que de amor morressem. Era muito tarde quando ao telefone a voz se despediu com um beijo tão doce a sentir o gosto de uma cereja tão pura do outro lado da linha.
Essa mesma voz, que agora cantarolava na janela, minutos antes, em súplica, jurava um amor que acabara antes mesmo de nascer. Eram imaturos demais. Pequenos demais para se deixarem levar pela grandeza da ausência do outro. O frisson da saudade abalara não só o coração e os olhos, mas a certeza de que tudo estava tão bem como haviam deixado da última vez que se viram.
Não havia mais esperança de encontrar a casa arrumada, os móveis e os sentimentos nos mesmos lugares, antes deixados, era tarde, para de fato conhecer a porosidade da qual escapavam as lágrimas. Sentiam apenas. e não se demoravam a abarcar num abraço que não sabia se de despedidas.
Era sempre assim antes da chegada. Não se podia ter a certeza de que tudo estava como era. Mudavam de estação. Tremiam por motivos opostos. Sempre.
A voz apaixonada do outro lado da linha não esperava canção alguma. A moça na janela, sonhando o beijo roubado de dias atrás não fiava na certeza de outra chegada. Era assim que viviam, entre lembranças e saudades, canções de despeidas. O amor em bruta flor, revogando um espaço para que de fato nascesse.
Estavam tão longe e tão perto a trepidar os olhos quando em cima da mesa via a fotografia do beijo. Não entendiam aquela distância. Fartavam-se de esperanças vís. Mas lutavam, de qualquer forma para que de tudo, aquele sentimento que crescia, mesmo sem saber o nome, vivesse neles. habiatando palácios desconhecidos e cheios de vento."

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Do amor que chega



"Era difícil pra você entender que no amor precisávamos nos entregar desmedidamente. Que não tínhamos escolha. Que essa entrega era condição primordial.
Era difícil, eu sei, muitas vezes olhar dentro de mim e ver aquele rio-mar, tão turbulento a me fazer esquecer das muitas presenças que deixei de ser ao seu lado.
Era difícil me ver tão perdida, tão violenta, tão humana. A tentar caber dentro de ti, tão fantástico, tão príncipe, tão homem.
Era difícil, eu sei, caminhar sobre escombros e ainda ensaiar uma valsa, para que de longe eu sorrisse e deixasse de ser tão triste.
Era muito mais confortável, muito mais fácil se não houvesse nada, se o silêncio estivesse vestindo nossas falas e nossos olhos, porque assim, nunca haveria aquela cumplicidade toda, de tardes a fio de choro, de noites a dentro de desejos, de manhãs incontáveis de despedidas. Seria muito mais fácil se o amor não houvesse brotado, se tudo não passasse de sonho tão doce de uma madrugada.
Mas não, teimosos, famintos em querer viver, fomos nos levando um para dentro do outro, embutidos num sentimento tão puro como bruto, que jamais saberemos de fato descrever, nomear, fomos nos deixando ser um, comprometidos com nossa demasiada realidade de carência e afagos. Fomos teimosos, inconsequentes, e nos deixamos caber um dentro do outro, fomos nos deixando ser roídos pelo amor, pela sua febre, por sua devassidão.
Era tão difícil e eu sabia, que por vezes era mais fácil ter escrito uma carta, e deixado tudo para trás, era menos doloroso, menos arriscado, se em qualquer instante fizéssimos as malas e deixássemos que a partida nos levasse para bem longe. Terras desconhecidas, mares revoltos. Outra cidade, outro nome, outra morada.
Mas de que adiantaria a fuga, se em nós já havia nascido o laço, a ponte? Era tarde, tão tarde quando de algum sofrimento nos abatia, e o desejo de ir nos impulsionava em começar a fazer a mala, não havia mais saída. Não suportaríamos a dissociação do amor. Não podíamos mais ser diluídos, esquecidos, evaporados. Éramos inteiros. pedaços. o amor já havia nos roubado a paz, a guerra e tornado a nossa condição de dualidade em unidade.
Era difícil, eu sei. Mas tornou-se alento, conforto, Tornou-se condição, estado primário de nossa vida. e hoje, ainda machucados, mas saciados de nossa fome maior, caminhamos juntos, de mãos dadas, de olhos embriagados de castanhos e verde-azúis tão fartos."

Da Surdez

"Estou surda. Absorta em qualquer palavra que se perdera dentro de mim que ainda retumba. Não pensei que ficar surda fosse de igal proporção a ficar cega. Não ouço nada, nem mesmo o eco das palavras que conhecia. Parece-me que roubaram o meu paladar também. O roçar sobre a minha pele também é mínimo. Sinto apenas uma brisa fresca. Sintomas do inverno que se aproxima. Vejo qualquer sinal do tempo acontecendo assim, flores desabrochando num silencio a se perder. Parece-me escapar as horas.
Estou faminta. E não há de que me alimentar. Meu canto fugiu. Minha palavra foi embora. fizeram as malas ontem. O amor esqueceu de deixar bilhete. Minhas mãos procuram algum cigarro.Um conforto sem escrúpulos. Ando na espreita dos meus fantasmas. Restaram-me sombras. Não sei se acredito nessa verdade ou se vou me iludindo. Inventando qualquer roteiro para que mais tarde sofra. Ainda sim, bem ao longe vejo certo cismar do tempo. Um velho senhor de óculos a apontar em minha direção.
Estou ainda trépida. Amarga. Foge de mim aquele cheiro doce. Agora transpiro a poeira dos dias. O pó do qual talvez fomos feitos. Somos então tão efêmeros. E não importa, não estamos livres dessa condição. Sempre seremos diluídos. Sempre nos perderemos. Parece-me que sempre estaremos misturados a qualquer outro evento natural. Voltaremos ao pó. Seja de qual modo for.
Esqueci-me nos caminhos que cruzei. Deixei de mim mais que poderia. Entreguei-me sem que tivesse em mim reservas. Não me preocupei com a salvação. Estou perdida. Surda. Fugiram de mim sinais de alerta. Estou completamente exposta. Serei agora guiada pelo silencio da língua. Em breve estarei muda. Mais nada."