segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Recado ao vento


É um novo tempo. Tempo de acalmar o coração tropical. Aquela fogueira de antes. É tempo de se desfazer das promessas, das roupas. Dos sapatos que por qualquer motivo faziam barulho na chegada. É tempo de recolher. De se esconder de qualquer solidão. De qualquer saudade ou lembrança. É tempo de erguer a cabeça. Os olhos. Vislumbrar nossos horizontes. Outro pôr do sol. Ou qualquer ventania de chuva escura que escorre janela adentro do carro, da sala. do quarto. É tempo de não amar, de apenas deixar quieto um coração que por vezes sangra. que por qualquer razão desconhecida a olhos atentos, chora; é tempo simplesmente de aquecer as mãos em qualquer fogueira externa. Porque por dentro tessituras frias, metalicas ressoam como um adeus. uma despeida para o fim.
É tempo de rasgar as cartas, os bilhetes, esquecer os beijos. Deixar que o azul tão verde se apague ou se transforme. Porque não há mais esperança. Não há mais saída; SEJA COMO FOR.

pS: com alguma tristeza e pesar.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Não suporto mais


Resta-me uma última opção, talvez uma última (única) saída.
Resta-me a falta de gosto, desprezo, ou qualquer solidão besta a violar a falência intranquila dos meus dias.
Resta-me qualquer falta de coragem, de decência. de vontade. Arruinaram-se os pilares da minha pouca mas infinita amargura.
Resta-me o silêncio das palavras que antes juradas, enfeitadas, hoje mortas pela mesmice do cotidiano que jorra, ameaçando a vida.
Resta-me a pouca verdade de um amor dionisíaco, resta apenas um rastro de cinza que vem descendo sem qualquer chance de ser fenix.
Resta-me sufocamento e nem mesmo a noite, insonia e cigarros, somente o trepidar sonhos profundos, lapidantes...
Resta-me qualquer pedido de desculpas. qualquer falta de renúncia. qualquer despedida.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Mudanças

Vejam vocês, acordei com imensa vontade de mudar de roupa, de tingir os cabelos de cores impesáveis, acordei com vontade de não ter vontade de nada, de me deixar aqui, deitada, perdida em papéis e amores, em segredos e confissões, em relatos e detalhes. Acordei, sem ao menos abrir os olhos e mesmo assim, insone, ví o brilho maior da manhã nascer ainda no meu ventre faminto por um café e algumas bolachas.
Vejam vocês. Eu não quero mudar os esmaltes, nem os sapatos. só as roupas, essas me cheiram saudade, alguma doída lembrança que quero esquecer mesmo que só por hoje. Olhem com um olhar profundo, troquem a lente, vejam por outros ângulos a decência do desejo de mudança, mesmo que por um instante, por um minuto, por um relevante segundo que parece pequeno.
Vejam vocês. Apenas vejam se não tiverem a mesma coragem mansa que tenho. aperfeiçõem neste desejo morno da observação; sejam francos na mesma medida dos fracos.
Vejam vocês. vos convido para tomar um café, cheirando framboesas frescas. para que mais tarde eu possa além de mudar, voltar a ser o que sou.

Meus Queridos Leitores

Aqui seguem algumas dicas inspiradoras de filmes que ví nesses últimos tempos que estive sumida!!! De-li-ci-em-se!!!!!!!!!!!!!!!
"Insolação" - (Brasileiro) Lindooo!!!
"A lista" - suspense interessantíssimo
"Diário Proibído" - bacana para fazer pensar sobre nosssas relações sexuais e afetuosas
"Nova York eu te amo" - muito inspirador
"Não é tarde para recomeçar" - (brasileiro) fantástico!!
Querido Jonh! - Delicioso!

Aproveitem as dicas!!
Um beijo!

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Da saudade

Tenho saudade dos cafés e das conversas; dos sentimentos que vão embolando feito novelo de linha colorida. Dos amigos, das canetas, dos blocos de papel em branco e dos versos, tantos a se perderem na imensidão do horizonte.
Tenho saudade de inventar as cenas, as pessoas, as fotografias, as lembranças que jamais pude pensar que viveria. Tenho saudade de você a percorrer minhas palavras, meus mistérios, minhas manhas e meus desejos. Uma incrível vontade de que tudo volte em breve, seja como for.
Tenho saudade de como florecia o amor, bem devagarinho, parecendo uma colcha imensa de retalhos multi-coloridos, sim, um painel de amor...!
Tenho vontade de que todos me acolham de novo com aquele imenso sorriso e que me deixem encantá-los de novo, com mais pedaços de mim e de minhas histórias....porque só assim meus caros, terei paz e minha saudade cessará!

Um enorme abraço!

domingo, 3 de outubro de 2010

Era

Era de sangue o bilhete deixado na porta. Ou batom, daqueles bem vermelhos a deixar os olhos confusos e indecisos; Era de saudade que falava apesar da chegada ter sido a poucas horas, era de desejo ainda que muito saciado há alguns minutos antes do bilhete.
Era de pavor que nossas bocas se engoliam. Era de engano que bebíamos quando trépidas já estávamos enroladas em cobertores no jardim. Era de encanto que nos fazíamos sem que pudéssemos entender quanto fantástico era fantasiar o amor inexistente. Era doce teu olhar na chegada, amargo na saída e incrivelmente desnorteante no meio da nossa transa.
Era de pecado as nossas juras, de perdão nossos desaforos, de loucuras nossas invasões. Éramos de pó e de qualquer coisa que flutuasse nosso pão-corpo-delírio. Éramos.
Éramos de manssidão, de silêncio e dor. Era sal nossa paixão derramada tão severa e serena. Era de amor, de ilusão nossos recados no espelho, nosso segredo escondido debaixo do travisseiro. Éramos de tanto pesar e ternura que nossos passos se confundiam solenes aos fantasmas daquela casa tão fria a nos juntar os braços e as bocas.
Era de tanto e de tudo aquilo que jamais julgaríamos se não além do humano. além do que podemos conhecer por amor, por carinho. ÉRAMOS mais. qualquer coisa que cheirasse mais de de-su-mano!

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Minhas desculpas

Em breve estarei de volta com textos bacanas para todos vocês....
Ando bastante ocupada e cheia de afazeres, com a mudaça pra casa nova também estou sem net, mas por pouco tempo!!

Prometo que no incío de Novembro estarei de volta e nunca mais me afastarei de vocês....Sinto uma enorme falta de todos, dos comentários e carinhos!

Um enorme beijo!
Mell Renault

Ps:Saudade de "Reino das Palavras", Equador das coisas....e tantos outros

Até breve com texto saindo da fornália polaroid!

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Luíza


"Ela gozava de uma liberdade intermitente. Sonhava mas precisamente mantinha os pés no chão, fincados numa realidade que conhecia sobretudo. Ela era livre também por isso. Porque conhecia os passos. Conhecia os caminhos de dentro e por isso também gozava de uma prisão absoluta.

Ela sorria com os olhos mais doces do mundo e chorava um pranto que qualquer poeta se enterneceria. Ela era metade mulher. Mulher inteira para alguns que visitou como amante. Metade mulher porque ainda gostava das cantigas de roda e de saias rodadas. Ela acreditava na esperança e na sorte. Gozava, inclusive, de uma grande sorte. Tinha presságios sobre a vida e a morte e se enganava a escrever versos tão curtos quanto intensos.

Ela rezava, acreditava num deus de pequenas coisas. Acreditava acima de tudo em si. Na força gigantesca que o amor que havia dentro dela podia mudar o rumo das águas.

Foi assim com André. Quando se conheceram amaram-se como se ama nos romances. Ainda hoje se amam. Tamanha intensidade. mas um amor mais manso. mais humano, passível de erros. de verdades. de cruezas. Ainda sim amavam-se. não com o despespero das falas engaioladas em juízos de amor e morte, mas numa linguagem que se exalta a vida. a alegria descontínua de amar com a razão; sim, André e Luíza se amavam com a liberdade da vida. com o gozo profundo das pequenas consequencias cotidianas. Amavam-se em meio a toalhas molhadas sobre a cama, o choro dos filhos, o arroz queimado. a pasta dental sempre em cima da pia. Se amavam com a coragem do corriqueiro. Não precisavam de ilusão para que de amor suspirassem mais tarde. Suspiravam. Simplesmente porque amavam concomitantemente.

Ela portanto gozava de maior liberdade ainda. Porque amava e era amada. na mesma medida. na mesma certeza. E amar assim requer grandes olhos que enxerguem o amor.

Luíza gozava de sabedoria. Bebia em fontes inesgotáveis. a realidade, da qual servia de alimento e fome."

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Clara


"Clara era pequena, e tão grande! Clara conhecia o amor e esquecia dele. Clara sonhava e vivia o real, acrescentando-lhe fantasias....
Clara era um rio de águas cristalinas, tinha olhos de sol e nas mãos margaridas que conviavam a um passeio ao seu lado.
Clara, tão pequena e tão grande inventava palavras quando não conhecia o nome de seus sentimentos, ria se doía muito, chorava se apertado estivesse o coração de uma saudade-luto. Clara acreditava nos contos de fadas e nas pessoas, doava-se sem medo de entregar tudo, deixava que pissassem em seu território, as vezes nem mesmo humano. Criava asas de uma borboleta vermelha, voava para infinitos que jamais pensava. Voltava com o pesar de quem jamais quisesse ter partido.
Clara era doce. e sua douçura confundia-se ao açúcar que temperava o café da manhã. perecia de um amargo. que não sabia se do próprio peso do existir. tinha sonhos em que era apenas um livro. um paraíso de lindas flores do campo. Clara era puro sonho e seus terríveis pesadelos a acordavam madrugando choros e soluços. Tinha a solidão. Tinha fotografias de seus amores. tinha a sombra de seus amigos a segurarem as mãos assustadas. Tinha medo embora isso fosse sua matéria de coragem.
Clara não existia. Sua ilusão era permanente. "

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Beatriz


"Faz de conta que Beatriz não tinha angústias. Faz de conta que ela sabia sorrir desatando o nó da saudade e que não esperava anciosa a chegada dele.
Faz de conta que Beatriz não tinha tristezas e que suas mágoas foram transformadas em rios rasos de águas prateadas e que o esquecimento era desculpa para um consolo além-flores que ela plantava no canteiro lateral da casa.
Faz de conta que ela ainda era menina e que sua infância de balas e doces nascia num deserto de poesia e seca. Que seus olhos nãõ guardavam imagens de despedidas e que o brilho fosco deles era apenas porque era inverno e o sol não podia cintilá-los tão profundamente como na primavera.
Faz de conta que Beatriz sabia lidar com as palavras e escrevia cartas de amor aconchegantes, e que seu silêncio era apenas uma pausa demorada e nunca o fim de um começo inesperado. Faz de conta que seu amor não sofria abalos nem fome. Que o vazio que ora a devorava ora a vomitava para fora de uma existência humana era apenas a reticência que jamais terá significado preciso nos poemas ou nas fábulas.
Faz de conta que para Beatriz fazer de conta era mais fácil, mais sutíl, mais inteligente que deixar que a realidade falasse por seus gestos solitários e secretos, faz de conta que para ela fingir era menos doloroso que ser. E por isso continuar fazendo de conta era mais emocionante e proveitoso que viver de fato sem qualquer máscara. sem qualquer mentira.
Talvez por isso então é que todos os dias muitas vezes por dia ela começava a pensar : 'era uma vez...' e tecia sua fala e sua pele, seus sonhos e vivências, sua fome e seus dias segundo a fantasia que alimentava a sua única verdade; a realidade crua."

sábado, 17 de julho de 2010

Thereza


"Thereza queria um amor que não desse trabalho. Que ela não precisasse cuidar. Queria que ele apenas existisse e mais nada.
Não queria ter de inventar pretextos. Não queria ter que escrever cartas e dar telefonemas saudosos na madrugada. Queria o amor puro. Livre como o azul do céu da primavera. Livre como folhas soltas de papel em branco ao vento. Assim era como Thereza queria amar. Sem o compromisso da fala cansada, dos beijos roubados, das dores da ausência, do sufocamento da convivência. Thereza queria amar apenas. Deixar-se solta neste estado ímpar do amor. Quer a embreaguez do primeiro encontro. O tesão do primeiro beijo. Quer a multiplicidade do olhar. A sua negação e afirmação, ao mesmo tempo.
Thereza queria alcançar a graça. Queria amar de longe, desinteressadamente. Queria a aventura do esquecimento, a falsa sensação do poeta. Thereza queria saber fingir amar. Sem ter febre. Sem ter angústia. Sem se entregar ao trabalho meticuloso da química dos corpos. Ela queria apenas o amor. Queria apenas amar o invisível, o intocável, o improvável. Thereza queria o estado e não a ação. Amar era mais importante que ter por quem morrer desse amor.
Ela queria o amor de silêncio. A bruta-flor do querer. Queria apenas querer, não se tratava de necessidade. era apenas desejo. Amar sem ter trabalho. Amar sem assumir romances. Histórias de amor eram sempre chatas. Queria apenas descobrir o amor. Desfrutá-lo sem dividí-lo. Talvez amaria a si, criaria dentro dela uma outra, para que assim pudesse representar a figura falsa do ser amado. Queria amar sem ter motivos. Sem dar presentes. Seu querer estava em participar da essência do amor e não de seus desdobramentos.
Thereza queria amar. Amar como criança que não precisa de razão. QUe apenas ama. Como o vermelho que é só vermelho.
Inebriada de esperança Thereza assim esperava, sem saber que de amor já vivia. que de amor já se alimentava."

Laura


"Era tarde para amar sem que de amor, antes morresse. Isso a fazia pensar em quanto perigoso era amar sem medidas.

Laura abriu os olhos pela manhã e chorou quando debaixo do lençól não encontrou aquela mão silenciosa que a segurava pela cintura durante a noite. Chorou porque amava e de amor morria sozinha. Chorou porque de saudade passaria todo o outono. Sentiu a brisa fresca que entrava pela janela e mais uma vez chorou porque seu desejo jamais seria saciado em tempo tão pequeno quanto durou aquele romance.

Ela misturou-se a ele. Perdeu a identidade que lhe fazia mulher tão sozinha e tão doce. Antes dele não amou. Decidiu-se por amá-lo quando as malas dele já estavam feitas. Decidiu-se por se entregar quando ele já escrevia o bilhete da partida.

Ela ainda pôde escutar o ronco do motor do carro sumindo pela estrada. Acendeu um cigarro, então. Decidiu que escutaria o som da partida dele fumando como no dia do primeiro encontro. Talvez isso o trouxesse de volta por alguns instantes, ou o levaria para sempre.

Nunca foi mulher suficiente para amar. Coragem tinha. Lhe faltava o homem pelo qual esqueceria seu nome e a deixaria nua, no meio da cidade. Quando este chegou, ainda quando sentia as baroletas no estômago ele a deixou, talvez por acreditar que só os amores infelizes existem de fato. Somente aquele amor que não pode ser consumado. Talvez por covardia. Por medo. Por não querer participar do ideal romântico dela. Isso Laura jamais saberia. Ele não lhe dera qualquer explicação para o fim. Talvez porque não houvesse mesmo. Talvez porque o fim seja apenas isso, o fim. Mas para ela, tão encantada pelos finais felizes, fosse preciso uma resposta, um motivo único ou múltiplo para o fim daquela história que lhe parecia tão bonita e eterna.

Ela não quis levantar. Precisava morrer para que de vida fosse refeita. Fechou os olhos e de qualquer forma deixou-se morrer. Amar era morrer, isso era tudo que sabia do amor. "

domingo, 11 de julho de 2010

Ciranda de Mirabella


Mirabella amava Marina
que amava Felipa
por seus olhos serem tão doces.
Felipa amava Patrícia
que amava Fernanda
por suas curvas tão fartas.
Fernanda amava Amanda
que amava Marília
por seus sonhos tão bonitos.
Marília amava Sofhia
que amava Márcia
por suas palavras tão sinceras.
Márcia amava Elisa
que amava Vitória
por sua delicadeza tão incrível.
Vitória amava Susana
que amava Virgínia
por sua calma tão acolhedora.
Virgínia que amava Clarice
que amava Luana
por seus atos tão imprecisos.
Luana que amava Mirabella
que só tinha olhos para Marina
que não suportava Felipa
que mataria Fernanda
que envenenaria Amanda
que destruiria Marília
que arrancaria os cabelos de Sofhia
que assassinaria Márcia
que não engoliria Eliza
que abandonaria Vitória
que magoaria Susana
que esconderia Virgínia
que expulsaria Clarice
que esqueceria Luana
só para que Marina
pudesse amá-la
sem nenhum empecilho.

sábado, 10 de julho de 2010

JOANA


"O cigarro aceso, a coca cola, os livros espalhados na cama, as roupas ao avesso no armário que prometera arrumar dias atrás. Esta é Joana, a menina mais rebelde o mundo. A que de sonhos enfeitou os seus braços, a que de amor morreu tantas vezes a não se acreditar, a que de repente cresceu tão pouco que ainda cheirava infância e jujubas;
de repente, Joana, tão ativa, tão infâme, tão mulher, pensou que amava este para sempre. sem mesmo saber onde era que começava tudo que sentia. Acreditou nesse pequeno delírio, mastigou e engoliu com tanta paixão, que de repente, mesmo assim, depois de um tempo diregida, ainda sim morreu mais uma vez de um amor que não queria. que não esperava.
mas que sentia.
Quisera ela ter feito as malas, fugido, abandonado, antes que deveras fosse tarde, antes que deveras não houvesse nada, mas, assim, medida por medidas desconhecidas, assumiu o desejo de ficar, sem muito pensar se realmente podia. Ficou. Porque no amor de Joana é assim. Instaura e fica. Não pede permissão. Não se acomada com aquela ternura dos apaixonados. Necessita de pavor, de fúria. de medo; de arriscar qualquer consequencia. Tenta ela, nesta mistura popularizar o amor romântico. Romantizar qualquer gesto insconsequente. Qualquer palavra problematizada. Qualquer sentimento engasgado.
Sim, esta é Joana, uma única em tantas, camaas e camadas de verniz, camadas e camadas de sentimentos brutos, de horrores brutalmente enfeitados. Jarros sobre a mesa de um crime tão passional quanto ela.
Sim, assim é essa Joana, de cabelos vermelhos, de olhos arregalados, de pele tão clara a perder-se em páginas tão brancas de palavras tão sujas. Sim é esta a Joana, tão enfeitada e divertida. Tão cheia de alegrias. Tão devotamente acompanhada. Sim. É está que vos falo. Menina tão mulher a trepidar. a derrubar em penhascos certezas de uma vida inteira.
Sim, calado a espreitar Joana, vos digo:
- Joana, tão bandida, tão menina. Tão cúmplice. tão Joana."

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Primeira Pessoa


"Conheço pouco de mim. Porque nada fica imutável. Sou eterna transformação. Sou eterna confluência de rio e mar;
Pouco sei porque desconheço qualquer evidência. Qualquer verdade. Sou em absoluto uma variante. Transito entre o fantástico e o real. Não conheço outra maneira de existir. Figuro entre passado, presente. O futuro, aquele que vejo vindo num cavalo pela janela? Não sei. Sou de poucos fatos. Gosto do imaterial. Por isso também sou do amor. Acredito inventá-lo nos dias de frio.
Aprendi a andar descalço cedo. Descobri a liberdade que existe em caminhar. então também sou feita de estradas. caminhos que percorro por dentro. Vou me bordando conforme o colorido da linha. Penso ser a vida uma enorme colcha de retalhos infinitamente alinhavados. Os que nos deixam, puídos como os panos velhos, vão-se descusturando e deixando ausências.
Não me peça portanto definição precisa. Gosto do mistério. daquilo que nossas almas são feitas. Essência é uma palavra tão bonita! Por isso também não posso. Alinhavo meus quereres e minhas esperanças. Sou feita do pó. do barro. dos imprecisos avanços do sentimento. Dou-me assim, mistura, multiplicidade. Porque minha unidade é o máximo. Ser singular é também ser plural. e isso me inventa segundo todos os delírios. Sou feita e vou refazendo aquilo que em mim dói. A dor são poros por onde transpiram minha escrita. Por isso também sou muda, escrevo na pele qualquer evidência do meu espírito. Uma mudez parada a saborer o gosto das palavras sistematicamente. Acompanho sinais de cegueira absurda, vejo por dentro. oculta-me qualquer desprezar da realidade. meus olhos vêem de longe, ultrapassam qualquer disfarse.
Mas ainda sim, não me peçam definição. Excluo qualquer ponto final, sou das vírgulas e das reticências. Não me cabe em lugares rotulados."

quarta-feira, 30 de junho de 2010

A Partida


"e ela se foi como quem jamais houvesse chegado. deixou apenas o seu perfume impregnado nos lençóis, nas minhas camisas.
e ela se foi sem olhar para trás sem qualquer renúncia, sem qualquer apego. deixou apenas sua palavra impregnada nas paredes, na minha cama.
e ela se foi levando presenças e lembranças, com os olhos cheio de espera, cehios de medo. e ela se foi porque havia chegado a hora. deixou qualquer recado ao telefone, qualquer carta escondida dentro de um livro, qualquer desejo de permanência.
ela se foi como a brisa a balançar a cortina da janela, a espalhar papéis , a balançar os cabelos. levou mistérios e olhares, beijos e amassos, afagos e gemidos. mas ela, ao meio dia de uma tarde de primavera, se foi.
talvez não fosse a certeza de sua ausência, seria mais fácil enganar o nó que vai se formando, quando ao meu lado na cama, ela tão menina e tão donzela, não houvesse deixado tão sutilmente.
e ela se foi como se tivesse se desmanchado, tal pétalas de uma margarida, desfolhada. deixou no cinzeiro resquícios de sua presença, deixou os sapatos, tão altos que me incomodavam, deixou sua caneta, aquela que mais gostava. foi embora com aquele olhar tão longe, tão perdido, a confundir-se com paisagens áridas e desérticas.
(...)
queria ter colhido ainda mais flores no dia de tua partida. queria ter falado qualquer verdade que a fizesse lutar, queria ter tido um pouco mais de coragem. queria que por causa dos meus olhos, verde-tão-azul, que ela se perdia e se apaixonava, queira que isso a fizesse ter ficado.
mas ela se foi. deixara em mim poesia e silêncio. imenso amor. imenso rio-mar.
e ela se foi tão bonita, tão serena, tão inteira a não partilhar nenhum pedaço de sua fuga. falava em seu ouvido que morrer era apenas fechar os olhos, mas ela, tão incrível e demente, tão doce e fervente, se foi sem ao menos dizer adeus.
(...)
queria ter inventado medidas, queria ser teu espelho de sonhos tão destruídos, queria mas queria tanto que sua alma não fosse tão livre. e mesmo assim, vestida com todas aquelas vaidades de sempre, ela se foi. tão perdida e tão repleta a me deixar de mãos tão vazias e olhos tão vagos de esperança.
ela se foi."

Súplica


"Salva, qualquer súplica, qualquer palavra desmedida. Salva, qualquer que seja a redenção. porque não quero morrer em pecado. porque não quero morrer de amor. Pois de amor é preciso que se viva!


entra e arruma tua cama, tua mala. escreve em mim bilhete de saudade. deixa em mim, qualquer gosto ou mau gosto. porque em ti sei que é meu aroma que te acompanha. remeta qualquer carta, cartão postal, ou deixa que o silêncio maldito das horas nos afaste para um sempre que jamais esqueceremos.


Devolve, de qualquer maneira o escarneo úmido que nos fez tanto em noites de gozo profundo e poucas verdades, poucas certezas.porque de paixão eis a redenção e o renascimento.porque de paixão eis a vida e a morte, seja em qual for circunstâncias.


entra e arruma em mim qualquer motivo para o beijo, qualquer desculpa para o abraço, qualquer consolo para o choro. porque em ti, terei abrigo, porque em mim de joelhos reza qualquer ladainha, porque em mim tens seio da vida.


Salva, qualquer mentira ou verdade, qualquer desejo ou farsa, para que bêbados possamos comemorar a evidência de nossa ingenuidade. para que felizes possamos morrer sob um céu estrelado ou não. para que de amor sejamos convencidos e vivificados.


Devolve seja como for aquele olhar que me aquece, que me motiva, que me protege o seu lugar devido dentro de mim, devolve todas as palavras e ensina-me como amar-te com silêncio e verdade. porque de ausência estou farta.


entra e arruma em nosso canto qualquer recanto de fuga, qualquer pedaço de ternura, qualquer fatia de amargura e juntos comamos o pão de todo dia, ainda que de vinho e água sejamos feitos em diferença. porque em nós há enorme vontade, enorme fome, enorme façanha, enorme febre. porque em ti, eis fato tão consumado em mim, porque em mim eis acidente tão conformado."



Entre nós


"Retifico-me sobre tua escolha. Minha palavra basta para inventar-te em mim. Sugo de ti suor e dor.Sou tua dor. é de mim que torto anda a carregar o peso. Acendo tantas chamas e estou no escuro. Seu tudo em nada me adianta. em nada. Sou onipresente nas facetas do teu dia, na tua cólera. no teu silêncio. na tua fome. Restauro ou inauguro em ti qualquer amor que de longe me aflinge. Amo-te com a cegueira do amor que devora livros, cartas, camisas, gravatas e chapéus. Coloro-te de vermelho. porque de sangue foi banhada nossa noite. porque de paixão nos lambuzamos a encher os dedos de fúria. conheço o trajeto trôpego da tua língua e esqueço ou ignoro o cinzeiro cheio de cigarros que antes era pretexto de conversas casuais, a esconder demônios dos nossos desejos.

Experimento o silêncio que me ofereces. Nenhuma palavra basta. Ou todas me bastariam se proferidas com o ódio e a loucura que nos faz tecer juntos colcha tão macia de nossos amores. Seremos assim, tão desmedidamente apaixonados, ainda que a sensatez nos afaste, ainda que nossas declarações endureçam nossos corações já gelatinosos de amor. Estaremos sempre envolvios por qualquer encanto, por qualquer ternura ou nudez. porque nosso elo, nossa forma nebulosa de nos conceber, já não cabe unidade. Somos dualidade. Somos gêmeos em amor e ódio. Habitamos o mesmo mistério e somos feitos da mesma carne. Não temos a salvação que a lucidez empresta aos realistas. Somos almas apaixonadas. Envenenadas por qualquer desculpa do outro. Sorvemos do outro. Jamais haverá em nós redenção.

Suplico-te que me ame sem que esse amor me mate. Suplico-te que tua palavra proferida jamais me enlouqueça. Porque em mim existe guerra e em ti, antes, havia paz!"

sexta-feira, 25 de junho de 2010

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Do chamado

Amor;
Eu preciso que você venha neste exato momento. Que esqueça os momentos anteriores. que venha com a calma e o sorriso de sempre, porque,meu amor, estou morrendo.
Eu preciso que venha agora. que deixe sua casa, sua vida. seus papéis, seus temperos e sua fome, e venha tentar morder minha boca com seu veneno impreciso.
Eu preciso que você venha neste exato instante. que traga pequenas doses de alegria, para que com os remédios eu engula a paixão e a saudade que sinto.
Eu preciso que você esqueça as notícias do jornal, a realidade batendo a porta, os pincéis e as tintas, porque de amor pretendo morrer esssa noite.
Eu preciso que você venha para que eu possa respirar um pouco mais aliviada. um pouco mais mansa, porque só você é capaz de amansar as minhas bestas tão agrestes.
Eu preciso que você venha e me ame como nunca antes. preciso do seu amor maduro, feito manga, para que depois de me lambuzar eu levante da cama e possa andar perturbada pela rua. naquele calor reconfortante do desejo que me causa.
EU preciso que você venha neste instante. que abandone o antes, para que agora eu possa viver em ti. pois estou morrendo. estou farta do presente que nos afasta. estou cansada da saudade e da dor da sua espera. eu preciso que você chegue. que abra as portas, as janelas, que esqueça sua mala no sofá da sala. que perca as chaves e as passagens de volta. que esqueça o horário do trem. que se demore no exercício de me salvar, porque estou morta e preciso de vida.
Eu preciso que você venha e traga apenas seus olhos, secreto azul a cobrir-me de vida. preciso das suas mãos decididas e de tes beijos afoitos. que me envolva em desejos esquecidos que você sabe onde encontrá-los. que me despenteie os cabelos e arranque meu vestido de renda. que borre meu batom e me deixe assim por horas, sentindo-me amada, para que de amor eu possa viver, antes que seja tarde.
eu preciso que você venha neste instante e esqueça todo o antes.
Ps: eu te amo!

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Pós-chuva


"era como enxugar as lágrimas depois de uma briga."
O meu pós-chuva resume-se a isso, um enxugar das coisas que vazam. ultrapassam a barreira dos olhos. exasperam a capacidade dos poros. me obrigam ao dilatar sem que haja espaço suficiente para desaguar.
Limito as condençar das coisas e exito por vezes medir qualquer esforço de controle, na chuva é assim, um eterno e sistemático desaguar. tento limpar as lentes dos óculos, os vidros do carro, das viraças da sala de visitas, mas neste pós-chuva, além da brisa fria que vem lembrar os ossos de suas validades vencidas, o que me vem são essas gotas, quentes, a torturar minhas páginas mais brancas, tão virgens quanto o sentimento.
Tento não me liquefazer como ela, tento me manter sólida, para ser devorada pela fome silenciosa dos amores, mas em muitos momentos sinto-me escorregar garganta abaixo de quem me deseja só não assume.
Revogo as promessas, os sonhos, as incertezas, percebo que depois da chuva, pareço amolecer não só de amor e saudade, mas de demência. minha doença deve ser contagiosa, compartilho esperanças alheias. reconheço os pés afoitos que engolem a escada. talvez seja o momento de reflexão. não entendo. acredito nas coisas fugidias. amanhã fará sol e eu nem sem se já haverá passado para escrever.

Do ato


um frio arrepiando, palavras quentes a derreter na língua um caramelo. a brisa, embriagada ao som de qualquer jazz volta-nos ao primeiro estágio de encantamento. mãos afoitas caminham procurando porto, segredo, desejo. olhos cheios de uma lágrima ausente nos embarga a soluços de um amor atrasado.

(...) fazia tempo que não nos amávamos.

viscos, salivas e surpresas tonteiam as sensações banhadas de um vinho esquecido na garrafa no chão. a cama, quente, definitivo esconderijo de quem ama, acolhendo qualquer gemido agudo ou mudo. abafado por qualquer jura que certamente será esquecida.

(...) fazia tempo que não nos entregávamos.

papéis pelo chão, cortinas cerradas, beijos robados entre dentes e pedidos, abraços que se perdem na intenção de acolhimento, somos devorados. esquecemos o tamanho da nossa certeza, desejamos navegar por mares desconhecidos em nós. precisamos nos afogar. para que de qualquer paixão morramos sobre a tarde e a noite que começa lá fora tão branda.

(...) fazia tempo que não nos esquecíamos assim.

os corpos em volúpia tremem a escuridão das sombras do quarto, não haverá mais palavras, não haverá mais desculpas, silêncio e som numa mistura a calar nossas verdades absolutas. teu corpo morada da minha vitalidade, meu corpo, seu esquecimento, abertos, inteiros, mordidos.

(...)fazia tempo que não nos desejávamos tanto!

qualquer melodia infeliz. qualquer cheiro que passasse despercebido. alguns sorrisos notados, algumas lágrimas amassadas, muitas sensações emboladas a nossos pés. em nossas pernas que já não andam, que roçam, esfregam-se seios e ombros, para que de prazer possamos banhar o instante.

algumas mentiras esquecidas na gaveta do criado mudo, a vela queimando a sálvia deixada sobre o tapete. as pétalas coladas ao suor do exercício anterior. e o amor, tão manso a comer nossos nomes, nossas peles, nossas vidas.

(...)fazia tempo que não me despia tanto!

Das promessas de amor


"andarei tarde em tuas curvas. viajarei por tua pele, por teus cantos, num exercício de amor sem medidas.
andarei por nossas lembranças, em nossas fotografias, para que me recorde e nossas mágoas e sabores por tão longos anos.
irei ao teu encontro desnuda, com olhos de esperança e saudade. estarei no mesmo lugar a tua espera. tomando aquele café açúcarado e mexendo nos cabelos para demonstrar a ansiedade da tua chegada.
escutarei suas palavras, me entregarei aos teus carinhos numa tentativa de calor, para que de febre sejamos envolvidos mais tarde numa cama de lençóis coloridos como seus olhos.
acreditarei em suas juras, em tuas promessas, assim de ilusões teceremos nossa vida. para que um dia, lembrando o início possamos ser feliz sabendo que tudo fora cumprido.
dormirei em teus ombros largos, deixarei que ande em meus abismos. pedirei um beijo durante a madrugada e sei que velará meu sono na tentativa de me proteger seja do que for.
amarei com o amor mais puro, mais humano, estarei em ti como em mim estará fixado, como num quadro definitivo. para que na saudade jamais esqueçamos de como estamos unidos.
andarei por ruas a procurar-te quando longe estiver, encontrarei saídas, fugas, para que nosso desejo seja realizado, mesmo quando impossível, porque quero morrer em teus braços.
andarei pelas calçadas a procura de sol. e suas mãos estarão cruzadas nas minhas, num exercício de companheirismo. de afeto. de união. que buscamos em muitos momentos quando ainda sozinhos; e que agora encontramos.
estarei a seu inteiro dispor, porque já não sou só minha, sou tua, numa mistura que não sei decifrar, apenas sinto"

Do ontem

"De ontem em diante deixei de mascar aquele chiclete rosa que vivia escondendo na bolsa. Deixei de tirar os sapaos na entrada e de deitar no chão espalhando meus papéis escritos pela sala. Deixei também de ligar a tv para me servir de companhia. era evidente a certeza da minha solidão acompanhada.
De ontem em diante deixei de pensar em coisas que só impressiona os filósofos, resolvi viver antes que fosse tarde. Deixei de ligar e deixar recados. Não me atrelo ao desespero do tocar do telefone. Resolvi ligar mais para mim, ouvir mais minhas canções. Pensei melhor e percebi que era mais fácil dançar sozinha.
De ontem em diante deixei que minha pele falasse. Transpirasse qualquer desejo. Cansei de viver os prazeres sozinha. quero a divisão exata que mereço. Deixei de pinar os lábios de um vermelho vivo para que de um carmim naural ele se colora na hora do beijo.Deixei de vestir o luto para enfeitar a manhã com cores infinitas do arco-íris.
De ontem em diante começei a escrever menos. Falar mais o que penso, o que sinto. Deixei de sofrer por tudo que acreditava. Sorrir ainda é o melhor remédio para as dores. Deixei alguns bordados para trás. Resolvi pintar, lambuzar com as cores da minha alma. é mais pertinente o envolvimento. Deixei de ser tão resumida, quero a sensação confusa dos discursos longos.
De ontem em diante deixei de perder. Resolvi por acidente ganhar um pouco, mesmo que ganhos improváveis. Resolvi investir no risco. No sonho. Deixei de amar com a cabeça. arrisco-me num salto para dentro do peito. Amar sem qualquer garantia, de ontem em diante, resolvi que não queria mais nenhuma certeza. queria apenas o risco, o acidente truculento da vida. pura. em seu estágio bruto.
De ontem em diante esqueci no armário todas as velhas camisas que me faziam mais séria, mais educada. quero apenas o devaneio. a confusão das sensações a engalfinharem meu estômago. Deixei de apreciar as temperaturas amenas, meu coração tem febre. Deixei também as pessoas e os lugares que de qualquer modo nunca me fizeram bem. deixei-lhes um bilhete, uma desculpa. Precisava de libertar das idéias mornas. atirei-me num fogo dionisíaco. queima minha alma desde ontem, então.
De ontem em diante, passado e presente serão diferentes, escreverei outra história de amor, outro romance, terei outro cais, outro porto por onde escoarei minhas mágoas. Deixei os livros, as fotografias, os desenhos que rabisquei em cadernos velhos de sentimentos e pecados. Abanonei a solidão mofada nas minhas mãos. Arranquei os sapatos, tirei os anéis. Resolvi andar sem qualquer estrada, caminho, destino. Acho que descobri desertos em mim, de flores imensamente coloridas. de sol tão quente e inverno tão rigoroso. Era preciso que eu tomasse essa decisão. Abandonar tudo aquilo que eu pensava ser vida, e na verdade era um estado vegetativo.
De ontem em diante, nasci para um novo mundo. sem qualquer amargura, sem qualquer mágoa ou saudade. Deixei o passado para que o tempo colhesse seus frutos. O futuro visto no ontem me impressiona. Serei feliz. Uma felicidade quase clandestina. porque somos todos clandestinos quando decidimos por opção viver como se não houvesse mais nada, apenas este instante vivo. Amanhã talvez seja tarde demais. e não quero ser vítima dessa condenação.
De ontem em diante resolvi que viveria a medida que morresse. para que na morte de qualquer forma eu viva."

terça-feira, 15 de junho de 2010

Das tentativas

" Eu tenho tentado ser menos boba. Menos menina. tenho tentado caminhar com a sensação de que haverá outras chances. Tenho tentado parecer menos doída. menos pequena, embora muitas vezes seja difícil.
Eu tenho tentado acordar de manhã com menos medo. com mais certezas. com qualquer brilho no olhar para que de tristeza não morra. tenho tentado ser menos dura. olhar para as flores dos canteiros. tenho tentado não parecer tão sem rumo. meus pés tentam alcançar passos alheios....
Eu tenho feito mais sonhos, tomado menos café. Tenho tentado compreender mais as pessoas, embora quase nunca ser entendida. Tenho tentado ser franca, olhar de frente para os fatos, não me deixar enganar por eles. As vezes dói ter que encarar de peito aberto, mas isso se faz cada vez mais necessário.
Eu tenho tentado me abrir como uma rosa, deixar que minhas pétalas falem por mim, estou tentando tirar o ferrugem das palavras mais doces. Para que de afeto o outro me receba. Tenho tentado aceitar mais as razões que desconheço. aprendendo a rever limites, conceitos. Aprenendo a costurar na colcha de retalhos panos mais coloridos. Tenho tentado rir mais. Dizem ser contagiosa a alegria. preciso de um banho de felicidade e flores do campo.
Eu tenho tentado acreditar mais em qualquer coisa que me tire do chão e me faça maior que qualquer tempestade, choro, mágoa que ainda vem pela frente.
Tenho tentado e permaneço em estado de espera.

No som "Paciência" e um incenso de Margaridas para aquietar o coração.

Do amor que desejo



"Eu queria te amar assim. Repleta de reflexos da tarde. Queria me embrenhar nos teus braços e esquecer quanto tempo falta para a hora da sua partida.
Queria ficar assim, estática, num abraço demorado, numa emoção congelante, a tirar de mim o ar dos pulmões tão vivos na tua espera.
Eu queria te amar assim. Dando saltos ao teu encontro. Ouvindo qualquer bossa no ouvido. Sorrindo qualquer lembrança sua.
Queria estar assim, em permanente estado de entrega. Dar-te todas as dobras da minha vida em cartas feitas em madrugadas de frio e insônia.
Eu queria te amar assim, desmedidamente. Como criança sem qualquer limite, desvenando a palavra liberdade e escrever em meus olhos, qualquer jura que de vez te convencesse do amor desastrado que sinto.
Queria que me amasse exatamente assim, com carinho e respeito. Com afagos e segredos. Com pedidos de casamento todos os dias. Com gemidos e cumpliciades de tempos antes.
Eu queria te amar com a mesma certeza de que existem estrelas. Com a mesma fúria dos vulcões e das tempestades. Queria na calmaria de um beijo sufocar qualquer saudade que ficou para trás.
Queria segurar suas mãos, andar pela rua, abraçar na praça, esquentar suas palavras para mais tarde torná-las sensações desesperadas. Porque de amor sei que estamos sendo curados. porque de dores se refaz nosso afeto.
Eu queria te amar assim. E te amar e te amar e te amar...

Porque neste instante de manhã tão fria, amar você é qualquer coisa de quente que me esquenta agora!"

No som "Sonhos" e um incenso de Laranja para enfeitar. Na boca o amargo da nicotina para temperar nossos beijos.

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Do sujeito


"...Sujeito. Finito. Verbo de ação. Variações entre o abismo e o salto. Proporções alteradas. Visões absolutamente subjugadas.
canções e silêncios. passos pouco acelerados. razões e sentimentos embaraçados. Sujeito. aquele que transita entre a formação do possível. aquele que acredita que no eterno, no infinito. mas o que de fato existe? (certeza e um fim).
...
No som, borbulha qualquer barulho a deixar que ela não pense mais nada. Não é necessário pensar. é preciso que se viva com qualquer urgência. é necessário gastar os sapatos. é necessário. Ela precisava encontrar qualquer sonoridade a compactuar com sua emoção exorbitante dentro do peito. era necessário que de música fosse consumida. para que de longe quem observasse ficasse convencido de que existia de fato qualquer finitude nela.
A paz que exalava dos movimentos era quase como um abraço no ar, isso também era necessário, para de que companhia não morresse só. enganava as borboletas no estômago com qualquer chicletes rosa que mascava desesperada. aumentava a sensação de medo. mas a paz que exalava de seu gesto emudecia qualquer saudade ou guerra.
Teimava em acreditar no eterno, apesar de tantas vezes efêmera. Alguma verdade precisava ser absoluta. mesmo que custasse caro. talvez comprasse uma mentira e dela fizesse verdade para que de ânsia não morresse sem qualquer certeza.
A música ainda sim jorrava em seus ouvidos qualquer uivo. prescrevia ilusões, ideais, que ela não acreditava, mas fingia. não conhecia o profundo, mas apostava a fundo em qualquer tiro no escuro.
Queria porque queria a palavra sempre como companhia. mas não tinha. 'sujeito. finito'. fiava-se apenas na pequena delicadeza de cantar qualquer vontade. e ainda sim pensava, "hei de me enganar, sendo eterna, ainda que esquecida".
... ainda sim, sujeito. finito!
e era tudo que podia pensar. conflitos musicais numa tarde de inverno flutuante."

De nenhuma certeza

"A voz apaixonada dirigia a janela uma canção sem qualquer conforto. Era tarde a hora da espera. Era tarde para que de amor morressem. Era muito tarde quando ao telefone a voz se despediu com um beijo tão doce a sentir o gosto de uma cereja tão pura do outro lado da linha.
Essa mesma voz, que agora cantarolava na janela, minutos antes, em súplica, jurava um amor que acabara antes mesmo de nascer. Eram imaturos demais. Pequenos demais para se deixarem levar pela grandeza da ausência do outro. O frisson da saudade abalara não só o coração e os olhos, mas a certeza de que tudo estava tão bem como haviam deixado da última vez que se viram.
Não havia mais esperança de encontrar a casa arrumada, os móveis e os sentimentos nos mesmos lugares, antes deixados, era tarde, para de fato conhecer a porosidade da qual escapavam as lágrimas. Sentiam apenas. e não se demoravam a abarcar num abraço que não sabia se de despedidas.
Era sempre assim antes da chegada. Não se podia ter a certeza de que tudo estava como era. Mudavam de estação. Tremiam por motivos opostos. Sempre.
A voz apaixonada do outro lado da linha não esperava canção alguma. A moça na janela, sonhando o beijo roubado de dias atrás não fiava na certeza de outra chegada. Era assim que viviam, entre lembranças e saudades, canções de despeidas. O amor em bruta flor, revogando um espaço para que de fato nascesse.
Estavam tão longe e tão perto a trepidar os olhos quando em cima da mesa via a fotografia do beijo. Não entendiam aquela distância. Fartavam-se de esperanças vís. Mas lutavam, de qualquer forma para que de tudo, aquele sentimento que crescia, mesmo sem saber o nome, vivesse neles. habiatando palácios desconhecidos e cheios de vento."

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Do amor que chega



"Era difícil pra você entender que no amor precisávamos nos entregar desmedidamente. Que não tínhamos escolha. Que essa entrega era condição primordial.
Era difícil, eu sei, muitas vezes olhar dentro de mim e ver aquele rio-mar, tão turbulento a me fazer esquecer das muitas presenças que deixei de ser ao seu lado.
Era difícil me ver tão perdida, tão violenta, tão humana. A tentar caber dentro de ti, tão fantástico, tão príncipe, tão homem.
Era difícil, eu sei, caminhar sobre escombros e ainda ensaiar uma valsa, para que de longe eu sorrisse e deixasse de ser tão triste.
Era muito mais confortável, muito mais fácil se não houvesse nada, se o silêncio estivesse vestindo nossas falas e nossos olhos, porque assim, nunca haveria aquela cumplicidade toda, de tardes a fio de choro, de noites a dentro de desejos, de manhãs incontáveis de despedidas. Seria muito mais fácil se o amor não houvesse brotado, se tudo não passasse de sonho tão doce de uma madrugada.
Mas não, teimosos, famintos em querer viver, fomos nos levando um para dentro do outro, embutidos num sentimento tão puro como bruto, que jamais saberemos de fato descrever, nomear, fomos nos deixando ser um, comprometidos com nossa demasiada realidade de carência e afagos. Fomos teimosos, inconsequentes, e nos deixamos caber um dentro do outro, fomos nos deixando ser roídos pelo amor, pela sua febre, por sua devassidão.
Era tão difícil e eu sabia, que por vezes era mais fácil ter escrito uma carta, e deixado tudo para trás, era menos doloroso, menos arriscado, se em qualquer instante fizéssimos as malas e deixássemos que a partida nos levasse para bem longe. Terras desconhecidas, mares revoltos. Outra cidade, outro nome, outra morada.
Mas de que adiantaria a fuga, se em nós já havia nascido o laço, a ponte? Era tarde, tão tarde quando de algum sofrimento nos abatia, e o desejo de ir nos impulsionava em começar a fazer a mala, não havia mais saída. Não suportaríamos a dissociação do amor. Não podíamos mais ser diluídos, esquecidos, evaporados. Éramos inteiros. pedaços. o amor já havia nos roubado a paz, a guerra e tornado a nossa condição de dualidade em unidade.
Era difícil, eu sei. Mas tornou-se alento, conforto, Tornou-se condição, estado primário de nossa vida. e hoje, ainda machucados, mas saciados de nossa fome maior, caminhamos juntos, de mãos dadas, de olhos embriagados de castanhos e verde-azúis tão fartos."

Da Surdez

"Estou surda. Absorta em qualquer palavra que se perdera dentro de mim que ainda retumba. Não pensei que ficar surda fosse de igal proporção a ficar cega. Não ouço nada, nem mesmo o eco das palavras que conhecia. Parece-me que roubaram o meu paladar também. O roçar sobre a minha pele também é mínimo. Sinto apenas uma brisa fresca. Sintomas do inverno que se aproxima. Vejo qualquer sinal do tempo acontecendo assim, flores desabrochando num silencio a se perder. Parece-me escapar as horas.
Estou faminta. E não há de que me alimentar. Meu canto fugiu. Minha palavra foi embora. fizeram as malas ontem. O amor esqueceu de deixar bilhete. Minhas mãos procuram algum cigarro.Um conforto sem escrúpulos. Ando na espreita dos meus fantasmas. Restaram-me sombras. Não sei se acredito nessa verdade ou se vou me iludindo. Inventando qualquer roteiro para que mais tarde sofra. Ainda sim, bem ao longe vejo certo cismar do tempo. Um velho senhor de óculos a apontar em minha direção.
Estou ainda trépida. Amarga. Foge de mim aquele cheiro doce. Agora transpiro a poeira dos dias. O pó do qual talvez fomos feitos. Somos então tão efêmeros. E não importa, não estamos livres dessa condição. Sempre seremos diluídos. Sempre nos perderemos. Parece-me que sempre estaremos misturados a qualquer outro evento natural. Voltaremos ao pó. Seja de qual modo for.
Esqueci-me nos caminhos que cruzei. Deixei de mim mais que poderia. Entreguei-me sem que tivesse em mim reservas. Não me preocupei com a salvação. Estou perdida. Surda. Fugiram de mim sinais de alerta. Estou completamente exposta. Serei agora guiada pelo silencio da língua. Em breve estarei muda. Mais nada."

sábado, 29 de maio de 2010

Das minhas negações


Não me venha falar absurdos. Hoje estou abstrata. Intensa. Desnuda.
Não me venha falar em saudade. Com ela tomei até o último gole ontem.
Não me venha com tristezas. Respiro qualquer felicidade.
Não me venha com mentiras. Hoje quero a verdade escancarada. Rasgada. Bruta.
Não me venha fazendo manhas. Estive burra, hoje estou vacinada.
Não me venha querendo abrigo. Minha alma está ao relento. e gosto desse conforto da liberdade que experimento.
Não me venha falando baixinho. Estou com o grito atravessado. e quero sentí-lo na língua. dançando.
Não me venha com doces. Estou curtida no amargo.
Não me venha com graça. Perpasso pela danação. pelo pecado. pela condenação.
Não me espere. Porque de faltas vou desenhando-me.
Não me ligue. Mandei cortar os telefones. os pulsos, impulsos.
Não me faça perguntas. Ao incerto devo minhas escolhas. minhas renúncias.
Não me comprometa com suas razões. Sou feita de sentimento puro. e não sei navegar por precipícios sem que meu coração esteja em abundância fúria.
***
Não é que esteja apenas negando, não! estou apenas tentando evitar que depois você me diga como fui cruel.
ainda te espero sentada, com o velho cigarro de sempre. ouvindo aquele blues que você tanto gosta. cheirando aquele cheiro que você tanto se excita.
ainda quero-te como sol, casa, morada, descanso. mas não posso ser passiva a pedidos tão violentos. tão apaziguadores. minha alma bruta não resistiria a tuas lapidações. estaria perdida caso você me deixasse. como agora. ainda não chegaste.
o tempo vai engolindo as minhas esperanças. e eu vou negando para poder não chorar.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Aquela menina


"...ela tinha qualquer coisa de triste nos olhos. mas caminhava mesmo sem saber para onde. engolia com certa dificuldade a comida e os sonhos. olhava para o céu com uma esperança velha. empoeirada. parecia que jamais havia acreditado que seria feliz. ela ainda roía as unhas e fechava os olhos quando sentia medo. nisso havia certo lembrar de coisas acontecidas.

não acreditava em fadas, mas adorava se perder vendo borboletas voar. talvez quisesse ter asas. segredo que não podia contar. se comovia com o amor mas jamais se preparou para recebê-lo. tinha receio de se machucar ainda mais. optava pela paixão sempre. aquela que colore as roupas de sangue e suja as mãos de lágrimas. mas se atrelar a isso era mais humano que amar sem que deveras fosse amada.

ela jamais teve bonecas, vestidos rodados, carinhos e perfumes. aprendeu que precisava ser pura. ter a cara lavada e coragem. porque de qualquer forma, sempre estava nua. e viver sempre nua era correr riscos todos os dias. depois de tanto tempo não perdeu a vontade de ser feliz, mas sabia que o preço poderia ser alto, mais alto do que já pagava para empurrar a infelicidade para fora de sua casa todos os dias. ainda sim queria saber como era sorrir despreocupadamente. coisa que jamais pôde fazer. mesmo quando recebia migalhas. não se lamentava pelo fato de não ter esteio, porto, colo, abraço. sua miséria era maior que a expectativa de que tudo em algum momento passasse. ela conhecia profundamente as frustrações dessa espera. e desistira de lutar contra essa condição. preferiu caminhar com a salva da realidade. sobreviver. era muito mais importante que preservar o sonho. o tempo havia lhe ensinado que era preciso levantar sem que houvesse mão estendida. compaixão. e ela, menina tão doce, não se quiexava. emudecia sua fúria amassando a dor nos dentes, como a mascar um chicele que acabara o gosto fazia tempo.

precisou endurecer para que não morresse. jamais perdeu a ternura. mas isso ficava em camadas profundas debaixo da pele. só saltava pelos olhos quando se esquecia observando a lua. escapava um sorriso amassado. que logo era engolido. pela fome. pelo peso dos dias.

jamais duvidou que precisava crescer. atropelar os sabores de uma infância falida. rendeu-se a intermitência da vida adulta. alinhou a coluna para que erguida pudesse caminhar por vilas que não conhecia. era a vida. sua condição mais humana. seu estado mais bruto. enchia-se de uma coragem a comover olhos desatentos. e seguia. porque era preciso. porque era destino.

ela tinha nos olhos qualquer coisa de triste. e vivo. a cativar ilusões que ela mesma desconhecia..."


quinta-feira, 27 de maio de 2010

"..."

Existe em mim uma inexatidão expantosa. capaz de arrancar rubores na face de quem me olhe com mais paciência. Nunca fui capaz de definir se menina ou mulher. se flor ou borboleta. acho que muitas vezes pedra. tomando forma conforme o passo.
Fico entre a luz e a sombra. o ato e a criação. o que me dá direito de ser apenas um ideal. jamais uma realidade de verdade ou mentira. posso misturar ficção. atrelo-me a essa ilusão de que nada é como de fato mostra-se.
POr isso sou incompreendida. Por relativizar muito mais que pontuar. conheço mais das vírgulas. pontos finais não fazem parte da minha história, que preciso escrever todos os dias. Existo entre o espaço de duas vígulas, com a certeza de uma reticência. Tenho qualquer coisa que abomina o fim. tenho qualquer coisa que já é o fim. Parte de mim abre asas, a outra parte encerra. fecha os olhos. não sei quando sou noite ou dia.
Rabisco tentativas de identidade. sou toda felicidade. muitas vezes estado de graça. venho de qualquer paraíso. mas de repente desconheço pedaço que me completa. sou guerra. choro. vela. vago por distâncias que não cabem meus passos. perdida. como a procurar abrigo em dia de chuva.
Escuto canções que me fazem flutuar. adoro doces que me adoçam. brinco como criança de castelos e areia. derrubo meus sonhos. sobreponho outros. Vejo a lua, canto. peço qualquer proteção. tenho medo de escuro porque gosto das cores fortes. vibrano como meu desejo. Sou feita de qualquer ilusão passageira. e não tenho medo de passar. morrer também é mudar de estado. sofrer metamorfose é grande segredo.
Peço que de leve me observe. e diga com qualquer palavra o que sou. porque também sou feita disto. daquilo que me escapa aos olhos.

Das minhas faltas


"Falta-me o cigarro aceso entre os dedos para me ajudar a engolir esse bolor de luto que se aproxima cada vez mais violento e duro.
Falta-me.
Junto dessa falta, a ausência de qualquer coisa, qualquer palavra viva, anunciação de qualquer promessa, cumprimento de qualquer mandato. Estou atrelada ao nada. Aquele vazio oco, de onde escorrem fantasmas. Pouco me foi dado durante todo esse tempo. Com esses restos, fiz qualquer coisa que achei ser poesia. Qualquer coisa que me deixasse menos muda. Menos silenciosa. Menos desajeitada com as minhas mãos e língua.
Falta-me o ar, que por vezes invadia os pulmões cansados renovando qualquer esperança tardia. Pelo que sei, estar a espreita de qualquer sentimento é negar a distração do acidente. e ser previsível é algo que jamis seremos. estamos condenados ao acaso, seja como for.
Dos meus dedos, trêmulos, ainda saem caminhos que tento não seguir tão desordenadamente. Dos meus pés ainda reconheço a fome de vagar por lugares tão incertos, a me deixar nua. Dessa minha nudez, que por vezes, embora jamais concordasse, revejo todas as pedras que me atiraram e as cicatrizes, que embora, ainda restam, observo como quem esqueçe de lembrar de tomar qualquer remédio para ajudar a suportar a dor. (conviver com a dor, de certo modo, conforta!)Das minhas mãos, onde carrego como em conchas todo o meu sentimento, resta-me a segura, a desidratação de todos os prelúdios. Carrego nelas a inexatidão da minha vida.
Falta-me um pouco de calma. Olhos menos atentos, menos apavorados. Porque nesta escuridão, nada como um canto de acalanto. que jamais ouvi, mesmo escutando as melhores músicas. Estou em estado equatorial. balanço entre tantas verdades inperfeitas. desenho em qualquer canto de mim rastros, quero ser seguida. desvendada. mesmo que aos poucos. confluir salivas. palavras. qualquer sensação que me faça viva. ou me mate. porque morrer também tem seu mistério profundo.
Esqueci de deixar qualquer luz acesa. para que quem quiser não errasse o caminho do abismo que se desmancha gradativamente. no meu deserto murcham-se as flores daquele lilás tão vibrante. sintonizo com o arco-íris. num luto tão barulhento quanto aos gemidos ensaiados por vezes em braços tão estranhos e familiares. já não sei render a essa luxúria. o prazer me devolveu o silêncio e a língua cansada. como meu peito, que já não reconhece batida. palpita. engasga. o amor tem dessas preguiças. ainda sim esqueci de deixar qualquer sinal. para que pelo menos pelo perfume alguém venha e me siga. tenho pressa de ser tudo. embora me confunda em cores e semitons, tão inventados como meu sorriso.
Falta-me qualquer razão. qualquer buraco razo onde eu possa me deixar por algum segundo escondida, esquecida. estou exposta até as víseras. e meu coração já é chão. esteio por onde piso.
Sofro desse vazio irreparável. repleto de tudo. numa constante guerra de dois mundos. eu sofro de todas as coisas e estando assim, sofro ainda mais de nada. porque não conheço outra maneira de mentir. de deixar que minha verdade fale.
de repente me calo, engulo qualquer vestígio de ilusão, amor, sonho; me preparo para mais um mergulho. que não conheço, mas que de qualquer forma, me salva."

terça-feira, 25 de maio de 2010

Do Escrever



"Eu escrevo porque não sei fazer outra coisa senão ouvir palavras dentro de mim. Escrevo simplesmente porque me render é mais fácil que resistir. é mais intolorente que suportar. Por isso escrevo também, porque não conheço outra forma de ser mais irresponsável e intolerante. Latente. Pulsante.

Escrevo porque não cnheço melhor e pior remédio para minhas pestes. e não conheço maior segredo que domine todas as minhas bestas. por isso também é que escrevo, para que de silêncio eu jamais morra, para que de ausências eu esteja resguardada;mesmo que na companhia dos meus fantasmas. de suas vozes falsas, de suas verdades postiças.

Escrevo, portanto. escrevo para que de amor eu possa colorir os dias, e de raiva semear minha morte. escrevo para que de saudade jamais morra. e morrendo que deixe registrada num bilhete, sobre a cabeçeira.

Também escrevo sem motivo algum. apenas pelo hábito tão vil de deixar que a fala escorra pelo canto das unhas. que depois de salivá-las, elas possam molhar qualquer papel. qualquer coração. qualquer olhar perdido que divague por minhas loucuras.

Escrevo por falta de coragem. ou por audácia. para que de rancores meu coração jamais feneça. ou murche. como o de muitos que encontro caídos. Por isso também, para que eu não caia sozinha. que leve para dentro do meu abismo todos aqueles que em mim falam. porque jamais pude dar ao verbo vida sozinha.

Escrevo para que de febre não morra. e se morrer, que fique clara a falta de jeito. escrevo para me salvar da morte. para me salvar de mim. dos outros. de tudo."


**em homenagem ao Blog "Por que você faz poema?" do Herculano.


Escreve


"Escreve no meu corpo qualquer carícia sua.
deixa em mim qualquer vestígio seu.
qalquer desejo que conheço e realizo, mesmo quando cansados esquecemos a janela aberta e nos amamos para o mundo.

Escreve no meu corpo qualquer arranhão, qualquer mordida. deixa que de leve minha lembrança depois me devolva a incrível sensação daquele momento.

Escreve no meu corpo sua palavra mais bonita. mais sincera. mais safada. mais desmedida. porque em nós quando na cama, nunca sobemos medir qualquer gemido.

Escreve no meu corpo sua saudade mais aguda. para que de lembrança eu morra a tua espera. para que de desejo eu sufoque qualquer pedido. para que de amor eu viva a tua chegada.porque em nós existe qualquer sintonia de dor. muitos pedidos de desculpas.

Escreve no meu corpo teu desejo mais profundo, para que de confusões, delírios e fugas, nos encontremos sempre.

para celebrar o amor que deveras sentimos um no outro.

"...o que me resta é a memória da sensação de sua carícia. "


Nos olhos


Te olho nos olhos
e você reclama que me perco no razo da tua profundidade.
Te olho nos olhos
como quem busca porto em alta tempestade.
Te olho nos olhos
com a pureza dos passos de criança aprendendo a caminhar.
para ver se me ensinas o caminho, para que eu não caia.
Te olho nos olhos
com desejo de que me salve.
que arranque de mim aquele mal e me devolva sorrisos. sem que me cobres nada.
Te olho
como quem busca um outro mesmo olhar.
qualquer comprometimento com a farsa.
dentro de ti sei que pulsa o mesmo. a ânsia de te encontrar em mim.
Te olho nos olhos
e você desvia.
meus passos, meus dias, meus caminhos.
vou contigo porque me guias.
estou contigo porque estou segura.
Te olho nos olhos
quando me sangra o peito de uma dor incrível.
e teus olhos, tão azúis e verdes, mistura que tanto me fascina,
me cura.
Te olho nos olhos
querendo te dar mais amor.
e sou imensamente surpreendida!

Do que sou


Sou feita em pedaços. enxerga-me com qualquer multifacetamento que nunca entenderá.
Sou feita de detalhes e retalhos. bordada com linhas coloridas num mosáico negro.
Sou feita em pedaços. cosuturam-me em alinhavos frouxos, porque de amor morro sempre.
Sou feita de lugares e pessoas. sombras e sobras. noites e tantos dias. secos como minhas mãos.
Sou assim, um agrupamento de respostas sem perguntas.
uma sequência inexistente. um dispertar violento. uma calmaria passageira.
Sou assim, música ao longe. verbos decrescentes.
um conjunto de minicertezas e mentiras. uma ótica obtusa e desfocada.
Sou feita de eventos. primaveras e lua nova.
Sou feita de sal; ora com leve acentuamento de douçura.
Sou feita de ritimos, embora o silêncio me ensine o valor de uma nota.
Sou feita dessa deformidade de sentidos e motivos. acredito piamente nessa desordem de valores e censuras.
Sou assim mesmo, quadros sem foco.
verdades sem encaixe.
nunca busquei o exato. sofro de inexatidão. como minha existência.
So uma súplica, um pedido. um desejo.
nunca pude entender a vida sem esse valor dionisíaco.
para quê existem os prazeres se são condenados?
Sou assim, esse eterno mar de prazer e dor. sem qualquer culpa.
Sou feita então dessa necessidade de muito.
Sou feita do excesso. do exagero. porque tranborda em mim uma fome inesgotável de ser tantas. de ser muitas.
para que um dia, talvez, me encontre uma. e seja todas, sem menor a menor culpa.

Da Espera


"ainda estou esperando. esperando que alguém venha me buscar. que alguém com um sorriso tímido me encontre para um diálogo de palavras murchas e olhares indiscretos.
ainda estou esperando, com certa angústia e saudade. com certo medo e desejo. espero por este dia como quem planeja a própria fuga. atenta aos segredos escondidos nos detalhes.
Vigio o telefone, escrevo bilhetes, molho as flores do jardim, fumo o último cigarro do maço e espreito pela janela qualquer sinal aberto. qualquer caminhar parecido. qualquer detalhe pequeno que me levaria a esperança de ser você, atravessando a rua e vindo me buscar.
ando no vale de minhas (in)certezas. caminho com minhas milhões de ilusões. coloro as unhas e os lábios. invento histórias de amor. compro flores para ninguém e acrescento palavras no meu silêncio que muitas vezes tem me deixado nua. tudo isso para ver se a ânsia da espera seja domada por qualquer sentimento bonito. por qualquer ternura.
mas ainda estou esperando. buscando qualquer paz, qualquer guerra, qualquer pecado, qualquer samba, qualquer renúncia, qualquer concessão, para que de ilusão eu me enfeite a esperar tua chegada.
ainda espero pelo dia em que todas as nossas verdades serão castigadas, e que nos reste apenas o delíro da mentira. que saibamos viver dessa fantasia que chamamos de amor. porque de loucura é feita a maior sanidade. e precisamos estar preparados.
arrumo meus cabelos, perfumo minha casa, verifico a profundidade dos meus abismos, para que mais tarde, depois da tua longa espera, saibas caminhar em mim, saiba encontrar minhas mãos. saiba entender a secura dos meus olhos, saiba amar com aquele amor de tanto tempo.
ainda espero pela hora marcada. pelo rabisco no caderno, espero por qualquer briga besta, por aquele olhar tão sério e tentador de sempre. espero pelo último trago juntos. espero por nossa transa tão sufocante.
ainda estou esperando. com a boca encharcada de perguntas, com os olhos cheios de declaração, com o corpo frouxo, com a alma ereta. porque é desse amor que quero morrer. que quero viver. mesmo que seja tarde, meu amor."

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Do meu observar


Passei por ti sem que me notasse. Era tão pequena quanto a lágrima que escorria de leve, ao canto dos olhos. Passei por ti, tentando não ser notada. e não fui. precisava desse prelúdio do anonimato. do silêncio. queria prestar atenção em ti sem que teus olhos roubassem minha paz tão dolorosa.
Pela primeira vez te vi. com olhos de medo, de fuga, de sonho. com mãos de fantasia a procurar no meu corpo caminho. pela primeira vez te encontrei nu, completamente perdido em meus cantos, ora doces ora tão complicados e machucados. te vi com o coração preparado, em esteio, para um amor que nascia do fascíneo, da palavra cantada. do sussurro numa madrugada fria.
Passei por ti, tão despercebida como aquelas margaridas que nascem na rua do hospício. brutas, nascem no chão, no asfalto, prestes a uma beleza que ninguém observa, mas que existe. assim queria ver-te, num momento sem testemunhas, sem cúmplices.queria ver-te numa beleza bruta. a flor do seu querer, desabrochando viva....e vi...vi com tanta ternura que desse delírio fui rendida.
Em teus olhos tamanha poesia. tamanho desespero, tamanho encanto...tamanho fascíneo.
e depois que bem de longe pude te observar, quis que tua ternura me arrebatasse, quis respirar do ar de teus pulmões. beber de tua saliva tão doce e amarga. tão quente e tão fria. quis amar-te com um amor inventado, quis cobrir-te com minhas realidades, quis, depois de passar e nem ser notada, ser fotografia viva em ti, tão pulsante quanto tuas mãos a tatear meus espaços, meus pecados, meus gemidos.
e depois de tanto me perder no observar, deixei que me levasse para bem perto, bem ao teu alcance, para que de amor, ainda mais vivesse e morresse, sendo de qual forma fosse, em ti, contigo e para ti.