terça-feira, 3 de novembro de 2009

**Chuva Quente**




E tarde, bem tarde, depois de assistir todos os fatos, é que vi a chuva violar todos os movimentos seguintes, é que vi toda a enxurrada de palavras que não disse.
Bem tarde, só depois do jantar é que senti o cheiro do vento trazendo a chuva que molhava ervas, rosas e brejos.Foi bem tarde, longe das horas claras que pude entender aquele bilhete que dizia dos anos, do medo, do tempo.
Logo, depois que a Lua desaminada deixou de enfeitar o céu e a madrugada descalça enfiou-se no meu ventre tropical, é que pude sonhar com aquele momento onde tudo em silêncio falava mais que o rádio esquecido há tempos ligado perto do fogão à lenha.
Prevendo aquela chuva, rasguei papéis esquecidos no passado, para que do lado dos sapatos não restasse pistas. E chovendo sobre as casas, lagos, rios, e chovendo sobre as cabeças, os vestidos, as sombrinhas, choveu em mim, chuva tão quente que no lugar do frio, acalanto. E no lugar do assombro, desejo! E chovendo uma chuva quente, tudo aquilo que não foi bom era derretido, desfeito, reconstruído. Numa mistura de cheiros, gostos, dissabores. Fazia-se vivo o que já era morto! Assim nenhuma cicatriz, nenhum resquício, nenhuma miséria escorria das frases mal feitas do diário da menina.
E quando o sol começou a ejacular raios de alegria, a tal menina dormia, sonhando com chuvas em dias de frio.

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