quinta-feira, 8 de abril de 2010

Do que te ofereço

Sou feita de extremos. Não me conheço diferente desse enorme constrangimento. Eterno acidente do qual não só eu nasci. Nós todos. Alguns menos afetados e comprometidos. Mas todos sobre a mesma condição de acidentados.

Sou inteira porque fui refazendo metades. Sou então metades inteiras que no fundo simbolizam categoricamente um estilhaço a ranger dentes e músculos. Os ossos já nem falo mais. Sustentam um corpo que não ostenta. Suporta.

Queria mesmo era ter asas. Sair da superfície. Deixar que meus pés esqueçam os calos provocados pelas pedras da estrada. Mas sempre estou atrelada ao chão. Minhas asas são outras. desconheço a capacidade de voar com asas. Fujo com o pensamento. Inconstante e improvável. Temido por muitos, amado por poucos. Mesmo assim, queria saber voar. Ser borboleta tão colorida quanto meu luto.

Sou um agrupamento de sombras, de sobras, de luz, de raios solares. Tenho o cheiro da primavera e algum tom seco das flores do outono. Talvez sejam meus olhos. Eternamente tristes e curiosos. Sou toda uma trama natural. Não comporto enquadramentos. Respiro uma liberdade que não se alcança. Talvez porque não exista. E inventá-la é uma forma de me livrar das tantas prisões.

Não me importo. Atrelo-me a alguns significados. As palavras são minhas irmãs mais velhas, tenho-as como referência. Defino-me na difícil trama. Esfacelo-me. Entrelaço-me. Para que do chão o salto seja menos razo. que vasculhe profundezas ainda não exploradas. de dentro. de fora. porque nunca seremos unilaterais. eu não. sou o plural. preciso ser múltipla, para que eu possa ser única!

Avanço em direção ao inverno, na alma alguns resquícios do outono incrível que te conheci, nos gestos, ainda restos do que inveitei para ti. Que o frio me liberte do verão sinuoso que vivemos juntos. Porque também sou liberdade. Não me cabem prisões. só as noturnas.

Sempre serei esse emaranhado de sensações e palavras. Alguma música também, que sopre em ouvidos distintos qualquer nota funda de saudade. Porque há em mim também certa melancolia. Mesmo que calma, estarei sempre vinculada ao acidente. Eu, você, nós. Sempre. costuro-me em ti com esses extremos e assombros. aceitas?

(no som "lástima", incenso de flores silvestres e na boca um certo pavor. com amarguras)

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Atente-se para o Indizível: